segunda-feira, 4 de outubro de 2010

Cinzenta

Apesar do sol que brilhou, hoje estive assim: cinzenta. Não faz mal. Todos temos dias assim.
A sogrinha costumava dizer uma coisa. Aliás, muitas coisas, mas hoje só vou referir uma. Dizia aquilo como quem profere uma verdade segura e indesmentível. Ao mesmo tempo assumia um ar dramático. Quase se poderia dizer que tinha a pose de uma dama afectada, com os olhos revirados e a mão na testa, num ooh quase desmaiado. Eu sorria, meio sem saber o que responder. Talvez. Ela dizia-o com tanta convicção que, quem era eu para a contrariar?
Pois então, a sogrinha acreditava nisto: nós só morremos quando chegar o nosso dia. Enquanto esse dia não chegar, se não morremos, é porque ainda não acabou a nossa missão nesta terra. Todos nós temos uma missão! E sublinhava sempre esta palavra.
Tenho pensado nisto.
Talvez devido ao estado da minha mãe, não sei.
Mas a verdade é que tenho pensado nisto. E chego quase a pensar nisso com a mesma convicção com que ela o proferia. A vida tem um propósito, sempre. E chego a pensar que, se temos vida, se vivemos, se somos mantidos vivos, muito em parte não é para nosso prazer, para experimentarmos e vibrarmos com as coisas, para conhecermos e existirmos. Muito em parte, temos vida e vivemos por causa dos outros, para darmos vida aos outros. Mesmo velhinhos, mesmo moribundos, mesmo neste estado em que aparentemente já para nada servimos, acredito que, se Deus não nos tira o fôlego, é por causa dos outros, dos que estão à nossa volta. Porque até com o aparentemente nada e inerte e inútil, temos muito a aprender e a crescer. É principalmente naquelas fases da vida que nos põem de joelhos (e não será essa a melhor posição para orar, nem que seja apenas uma posição do coração?) que mais crescemos.
Talvez seja essa a nossa missão. Dar aos outros lições de vida que vêm da nossa morte e só então, depois, poderemos partir em paz.

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